Agostinho da Silva foi e é uma figura incontornável da nossa cultura e encarna uma série de elementos e ideias construtivas, transmitindo-as numa linguagem simples. Ele traz à nossa memória a imagem do sábio antigo que tinha o dom de provocar e estimular a nossa mente, de levar-nos a reflectir, de trocar-nos as voltas e fazer-nos pôr em causa tudo aquilo em que acreditamos, de tirar-nos todas as certezas e ideias fixas e de mostrar-nos que a verdadeira condição do ser humano é ser livre e que o verdadeiro sentido da vida é criar e não ser um escravo e/ou um soldado em guerra e competição com tudo e com todos. Na verdade, ele faz nos lembrar algo que todos nós já sabemos e sentimos lá no fundo, mas fomos habituados a reprimir por força das circunstâncias, pela formatação feita pela educação, pelos condicionamentos impostos pela sociedade e também pelas ideologias dominantes.
Naquelas aulas enfadonhas do Secundário, não me lembro de ter estudado nada sobre ele ou sobre o seu pensamento. Apenas me lembro de estudar autores que pessoalmente não me diziam nada e que, para além de serem impostos à força, não tiveram qualquer utilidade na minha vida, mas talvez eu andasse distraído, isso era habitual. Muitas vezes não sabia o que era pior, se era a postura e atitude de certos professores ou se era a má qualidade da maior parte dos colegas (os marrões, os inteligentes, os menos inteligentes e os baldas), os tais “meninos” que ele falava na entrevista e que, com algumas excepções, sempre se interessaram (e ainda se interessam) em impor modas e comportamentos uns aos outros. No fundo, constitui uma fase de preparação/treino para os disparates que se avizinham mais à frente na chamada vida “adulta”. Não sei se estou a ser demasiado cruel na minha análise, mas se não dissesse isto, o texto ficaria incompleto. Por isso, acho que era preciso mais Agostinhos por aí, era um Agostinho em cada esquina (e não um Salazar, como algumas pessoas dizem).
Hoje em dia, a televisão (em geral) parece ser um grande deserto. Salvo raras excepções, são quase sempre as mesmas pessoas e para dizerem sempre as mesmas coisas. Faz falta uma personagem como Agostinho da Silva, alguém que diga coisas diferentes, alguém que traga ideias frescas e saudáveis, ar fresco! Sem fatalismos económicos, porque a economia é apenas um sistema que pode ser mudado e se está a estrangular-nos, então que se mude de paradigma e que se invente outra coisa qualquer. Os sistemas não deveriam ser demasiado complicados, eles existem para simplificar-nos a vida, para servir-nos, para o nosso próprio benefício e não o contrário.
Há algum tempo atrás, quem é que poderia imaginar que teríamos uma pequena caixa fininha (o pc portátil e até outros aparelhos mais pequenos) que nos possibilitaria comunicar com qualquer pessoa ao redor do mundo, que juntaria todo o mundo numa rede (a internet) e que permitiria o acesso a informação quase ilimitada? Acho que podemos sonhar e ter a mesma utopia de Agostinho, até porque utopia não significa impossibilidade e, tal como ele dizia, quanto mais longe a História caminha, mais depressa ela progride, mais depressa as mudanças ocorrem. Vamos esperar que sejam mudanças para melhor e, por muito negras que as coisas possam parecer, é bom lembrar que noutros períodos da História elas já foram bem piores. Que haja lucidez e inteligência para mudar radicalmente de direcção e procurar o melhor e o mais natural (pessoalmente e colectivamente). Resta-nos desejar/esperar que, de forma mais gradual ou menos gradual, a sua visão/profecia se cumpra e que a utopia aconteça num futuro não muito distante.
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