A realidade tem truques?
Existem as “mecânicas “e os
funcionamentos da vida, situações que podemos observar dentro e fora de nós. Padrões
que se repetem e que geralmente não recebem a nossa atenção. É certo que nem
todas são leis absolutas. Umas baseiam-se em tradições e filosofias antigas e
outras são mais modernas, mas todas requerem atenção, até porque por vezes são
situações subtis.
Podemos encontrar imensas coisas
sobre estes temas, desde livros, palestras, cursos, etc- desde o âmbito mais
alternativo até ao âmbito mais convencional e ortodoxo, e tudo com objectivos
semelhantes: ajudar as pessoas a concretizarem os seus objectivos, ajudar as
pessoas a serem mais felizes, etc. Ferramentas, ideias, “truques”, dicas,
sugestões. Umas talvez mais credíveis do que outras. Cada uma baseada em
diferentes pressupostos e paradigmas acerca da realidade. Umas talvez mais
sábias, outras talvez menos sábias. Umas mais materialistas e egocêntricas e
outras de natureza mais espiritual, digamos assim.
Mas vamos dar um exemplo e, para
comentar, escolho algo saído da área mais alternativa: a famosa “lei” da
atracção!
Muito se tem escrito e falado
sobre isto recentemente: filmes, livros, cursos, etc, etc. No entanto, resumir
tudo a uma única “lei” talvez seja demasiado redutor, por isso não concordo com
tudo o que já foi dito e escrito em relação a este tema e certas coisas podem
até ser enganadoras. Nem tudo é tão simples, linear e imediato como alguns
defendem. Quer dizer, há pessoas que passaram a vida inteira com medo de
ficarem pobres, foram forretas, e a pobreza nunca chegou. Outros fizeram tudo
para conseguir algo e nunca conseguiram… E outros até tinham medo que o céu
lhes caísse em cima da cabeça e o céu nunca caiu!
Até sou capaz de aceitar a
existência e realidade desta “lei”, mas só até certo ponto. Suspeito que todos
temos potencialidades escondidas ou adormecidas dentro de nós, mas a verdade é
que também temos imperfeições, limitações, coisas e razões que desconhecemos e,
por tudo isto, com certeza não podemos fazer, ter ou concretizar absolutamente
tudo que queremos num determinado momento da vida… Para além disso, as
comparações com as vidas de algumas pessoas e o imitar os métodos e
concretizações dessas pessoas- tudo isso deve ser abordado com cautela e deve
ser motivo de reflexão, porque as circunstâncias e as naturezas das pessoas são
muito diferentes… Com isto não quero dizer que as pessoas não devem mentalizar
ou focar a sua atenção nos seus objectivos (objectivos que podem ser bastante
possíveis de serem alcançados e até mais do que legítimos), mas às vezes é
necessário reflectir e colocar um pouco os pés no chão, ser realista sem ao
mesmo tempo deixar de sonhar! No fundo, é isso.
Depois é também importante
referir que, por vezes, mais importante do que pensar ou visualizar um
determinado objectivo é simplesmente estar atento aos pormenores e às várias
possibilidades que se apresentam no nosso caminho e que geralmente não recebem
a nossa atenção (coisa não muito fácil de fazer). E às vezes parece que a vida
brinca connosco e é só quando nos desprendemos do objectivo inicial que ele
aparece mais tarde, espontaneamente e inesperadamente, porque até já estávamos
concentrados noutro caminho ou noutra possibilidade. E isso aconteceu talvez
porque estávamos demasiado obcecados por esse aspecto ou objectivo? Demasiada
obsessão por conseguir ou ter algo pode gerar preocupação e isso pode
atrapalhar. A preocupação e a ansiedade geradas funcionam destruindo a pessoa e
surgem associadas a uma elevada expectativa e apego a um determinado resultado.
Por isso, para além de tentar reduzir essa expectativa e escolher “estratégias
laterais” que rodeiam o “inimigo” em vez de “estratégias” que pretendem enfrentá-lo
pela frente, talvez também seja importante às vezes mudar o foco da atenção e
até “investir” um pouco mais em “estratégias” menos egocêntricas, transferindo
a “energia” do ter e conseguir para o dar, ajudar e inspirar outros.
Também não é difícil verificar
que muitas vezes a própria procura pela felicidade pode se tornar num problema.
No momento em que dizemos: “Eu tenho de…” podemos estar a construir situações
indesejadas. Esta afirmação, por si só, pode fazer muitos estragos… O desprendimento
tomado na dose apropriada pode ser uma grande ajuda.
Podemos atrair acontecimentos que
classificamos como maus e bons?
Umas vezes parece que sim e
outras vezes parece que não, mas sem dúvida que há certas coisas em que não
convém focar a nossa atenção, principalmente porque podem ter uma influência
emocional e psicológica negativa e podemos entrar facilmente em sintonias
indesejáveis. Hoje está bastante claro que, embora nem sempre consigamos colocá-lo
em prática, pensar de forma positiva influencia positivamente o nosso corpo.
Pensamentos e emoções positivas têm um efeito benéfico na nossa saúde, etc.
Mais cedo ou mais tarde, colhemos
aquilo que semeamos?
Talvez…
Depois temos também aqueles que
defendem que devemos insistir e ser persistentes e eu acho que têm razão,
concordo! Mas atenção porque nem sempre é bom persistir. Se alguém quiser ir em
frente e tiver uma parede no seu caminho, ao persistir só arranjará hematomas!
Talvez seja melhor passar por cima do muro com a ajuda de um escadote! Às vezes
é preciso mudar de táctica ou então mudar de caminho!
Mas esta coisa muito New age da
“lei” da atracção também pode ser muito desagradável nas mãos ou, melhor
dizendo, na boca de algumas pessoas. Há pessoas que estão sempre a doutrinar,
mesmo quando ninguém lhes pediu ou perguntou coisa nenhuma, e dizem todo o tipo
de trapalhadas e coisas inconvenientes. São peritos em criar sentimentos de
culpa nos outros. Há quem critique por criticar porque ou apenas querem
destruir ou simplesmente são pessoas negativas e desmancha-prazeres, não sonham
nem deixam sonhar. E depois temos alguns defensores desta “lei” magnética que
afirmam serem pessoas positivas, mas ao mesmo tempo destroem quem não consegue
pôr a tal “lei” a funcionar. Afirmam cruelmente que se alguém está metido numa determinada
situação e não consegue sair da mesma, então é por culpa própria e porque,
coitados, não têm vontade suficiente (para esses iluminados, tudo é fácil e,
principalmente, rápido). Ou então, principalmente hoje, e numa lógica
capitalista, podemos encontrar aqueles que dizem: “Então, já foste empreendedor
hoje? Estás nessa situação? Pois, isso é porque não és empreendedor!”
Todos nós já cometemos erros e já
dissemos coisas que não devíamos ter dito, mas há pessoas que abusam e muitos
destes defensores da “lei do íman” são uns aproveitadores e parasitas que
procuram sentir-se superiores à custa dos outros! Mas depois, mais tarde,
descobrem que afinal não eram assim tão fortes de ânimo, espirituais ou
superiores… Como se já não bastasse a mentalidade competitiva e oportunista da
realidade mundana onde quase tudo é feito para impressionar o outro, agora
temos também de aturar este tipo de competitividade espiritual, digamos assim.
Mas situações semelhantes podem
ser encontradas por todo o lado, não é só no âmbito New age ou mais
alternativo. O âmbito mais ortodoxo também tem os seus “joguinhos”…
Depois há também quem diga: “ eu
consegui x situação ou concretizei x objectivo porque mentalizei, visualizei e
soube usar a “lei” na perfeição…” É evidente que respeito a opinião da pessoa e
ela pode até estar mais do que certa. Mas será que ela não conseguiria essa
situação x de qualquer maneira? Essa é a questão! É a tal coisa: destino e
livre arbítrio- quando é que começa um e acaba o outro?
Por isso, nós desconhecemos muito
e às vezes as coisas têm de ser vistas num quadro mais amplo. É necessário
respeitar as pessoas e dar-lhes tempo porque nem tudo acontece de forma instantânea
nas suas vidas, nem tudo acontece segundo a sua vontade imediata. Por vezes as
coisas desenrolam-se dentro de esquemas próprios e que podem até servir um propósito
desconhecido. Na verdade, não sabemos. Então cuidado com o que dizemos aos
outros e, não raras vezes, as boas intenções só fazem é asneira! Podemos até
fazer sugestões, mas a forma como abordamos as situações é sempre importante. E
isso requer principalmente sensibilidade e perspicácia que podem ser aprendidas
ou inatas… Em certas situações, basta apenas perguntar à pessoa se ela precisa
de alguma coisa! E a resposta será dada!
E isto leva-me a pensar que
devemos tratar os outros da mesma forma que gostaríamos de ser tratados. É
essencial respeitar os outros (mesmo que esses outros não sejam humanos). Isto já
é uma frase gasta, mas falhamos frequentemente neste capítulo e existem razões
para isso acontecer… Outros “mandamentos” seriam: ter a liberdade para fazer o
que nos apetece ou experienciar o que desejamos ou o que sentimos que
precisamos, desde que isso não prejudique nada nem ninguém; cuidado com certos
julgamentos, principalmente os desnecessários, porque somos todos (quase todos)
imperfeitos e estamos todos metidos na mesma alhada; respeitar as opiniões e
crenças dos outros. Não forçar ninguém a acreditar nas nossas ideias e opiniões,
não querer mudar os outros à força porque isso geralmente não dá bom resultado.
E se formos consultados em
relação a algo, damos a nossa opinião uma vez e o resto depois é com a pessoa
que recebeu essa opinião, não temos de estar sempre a insistir!
Claro que muitas vezes as pessoas
estão enganadas nas suas crenças e opiniões e essas crenças e opiniões podem
até prejudicar-nos… E algumas prejudicam mesmo! Para além disso, se alguém
estiver perigosamente a caminhar no meio de uma estrada, pode ser conveniente e
necessário alertá-lo sobre os perigos e isso poderá ser feito mais do que uma
vez! Quero dizer que há sempre excepções, mas às vezes é melhor deixar as
pessoas em paz e não insistir.
Concluindo, ao contrário de
grandes truques e “leis”, a resposta pode até ser muito mais simples do que
imaginamos, mas não a conseguimos ver ou então não a queremos ver…
Se as “mecânicas” da vida
realmente existem, que cada um se estude a si próprio (auto-conhecimento) e
observe o meio que o rodeia. Que cada um faça as suas próprias experiências e,
se possível, não complique o que já é complicado!