Na publicação “ A Filosofia e as
Filosofias de Vida” falei sobre a meritocracia e, no que diz respeito a isso,
queria apenas completar esse texto, porque penso que ficaram algumas coisas por
dizer.
É evidente que, em relação a
desempenhar determinadas tarefas ou funções, um certo grau de meritocracia terá
sempre de existir. Por exemplo, se alguém tiver mais habilidade do que eu para
pregar pregos, terei de aceitar esse facto. Se eu decidir e realmente gostar
muito de pregar pregos, posso treinar até conseguir fazê-lo melhor. Mas, nada
me garante que o venha a fazer tão bem quanto a outra pessoa, mesmo quando me
esforcei e treinei mais do que ela. Da mesma forma, o aluno que estuda mais nem
sempre é o que leva a melhor nota. Por isso, o mérito nem sempre é fruto de
mais esforço e trabalho, mas sim de outros factores.
Não dei este exemplo por acaso. Coisas
como pregar pregos não deveriam ser vistas como demasiado inferiores a outras.
Um trabalho bem feito é sempre um trabalho bem feito, seja na área que for,
tudo tem a sua importância e há coisas que são vistas como superiores a outras,
mas apenas aparentam ser…
Portanto, o que eu critico não é
propriamente a meritocracia, mas as meritocracias, a forma (ou formas) como ela
é aplicada. Os tipos de meritocracias que temos hoje possuem aspectos questionáveis:
a meritocracia é vendida de uma forma enganadora, os critérios que são privilegiados
e a ausência de outros que são importantes, a excessiva competição, a crueldade
de excluir as pessoas de qualquer maneira e não lhes dar outras oportunidades,
o valorizar certas coisas e outras não, julgar os outros com base nestas filosofias
meritocráticas torna-se um trabalho difícil e muitas vezes é injusto, etc. E, frequentemente,
isto assemelha-se mais a dar um biscoitinho ao cão para que ele faça tudo o que
o dono deseja, ou seja, é mais pelo reforço e menos pelo gosto de fazer. Para
além disso, em certas situações, deveria haver menos avaliação e mais liberdade
e tempo para aprender.
Na prática, os ideais meritocráticos
actuais caem por terra inúmeras vezes e temos muitos exemplos disso. Sabemos
que nem sempre aquele que ocupa determinada posição ou função realmente merece ocupá-la.
Se a meritocracia serve para
construir hierarquias, então, quanto a mim, não vale a pena. Colocar pessoas em
pedestais, criar elites, classes, posições sociais e enfiar o poder todo nas
mãos de determinadas pessoas não me parece boa ideia. Não me interessa que
tenham ou aparentem ter um QI superior ao meu!
Se tudo for valorizado, cada um
seguirá aquilo que realmente quer e não o que dá mais emprego, protagonismo ou
estatuto. E que no futuro ninguém tenha de trabalhar para ganhar dinheiro!
Quando todas essas coisas desaparecerem, poderemos ver tudo com mais clareza. Delírio?
Talvez não! O avião já foi delírio, a viagem à lua também e, depois de ouvir
certos disparates na televisão, fico muito mais tranquilo em relação às minhas
fantasias (minhas e não só).
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